A residência de Toulouse-Lautrec
Historicamente várias centenas de propriedades são consideradas como Castelos na região de Bordeaux, foi nesse contexto que o projeto dos sonhos de encontrar um castelo com as características desejadas tornou essa longa missão particularmente excitante, contam as herdeiras Mélanie e Amélie Huynh. “Quando avistamos Malromé, imediatamente soubemos que nossa busca havia se concretizado. Além do fato de descobrir que era a antiga casa de Henri de Toulouse-Lautrec, essa questão adicional transformou nossas vidas, como se tívessemos descoberto um verdadeiro tesouro, que é o que o Malromé é de fato”, confessa Amélie Huynh. O Castelo Malromé é um grande domínio que se estende por mais de 60 hectares, escondido nas regiões vinícolas de Bordeaux, o castelo que foi abandonado por muitos anos e foi encontrou como um tesouro pela família Huynh. O projeto de restauração iniciado em 2013 e finalizado em 2017 contou com o suporte de arquitetos, decoradores, historiadores, especialistas do patrimônio e sonhadores, visto que o patriarca da família era um apaixonado pela França desde sempre. “O fato de termos nascido de uma união com uma francesa contribuiu com a realização do sonho de nosso pai, que era encontrar um castelo, mas não apenas qualquer um, ele queria que a propriedade tivesse uma vinha e que ela fosse na região de Bordeaux,” conta Mélanie Huynh.
Para contar a história dessa epopéia familiar e da aquisição do castelo que no passado foi a residência familiar do artista Henri Toulouse-Lautrec, Correspondance Magazine® conversou com Mélanie e Amélie Huynh herdeiras desse patrimônio durante uma visita especial ao Castelo Malromé, projeto nutrido e construído de um sonho, reformado pela paixão de pessoas extremamente zelosas, que se desdobraram para transformar a residência de Toulouse-Lautrec num lugar dedicado à arte contemporânea e ao modo de viver à francesa.
Conte-nos um pouco sobre a experiência de ter descoberto e recuperado, de alguma maneira, a alma do castelo Malromé.
– Quando assumimos os domínios de Malrome em 2013, o Castelo era uma “bela adormecida” e foi um verdadeiro desafio recuperá-lo. Os apartamentos de Henri de Toulouse-Lautrec tiveram que ser renovados e objeto de um longo trabalho de pesquisa. Felizmente a historiadora Colette Paris, que nos acompanha nos assuntos relacionados à conservação do patrimônio do pintor, é uma verdadeira especialista no assunto e completamente dedicada ao artista, que ela chama carinhosamente de “Henri”.
Em que estado vocês descobriram o castelo, que tinha sido abandonado durante anos?
– O pátio, como é atualmente, por exemplo, não existia, o telhado da adega ameaçava tombar e a ala leste do castelo estava completamente abandonada. Era impossível acessar o primeiro andar, que ainda se mantinha de pé por um milagre. Sabíamos que estávamos iniciando um projeto de transformação muito longo, que foi concluido neste ano, 2017. Da mesma forma, as videiras de Malromé, plantadas a mais de cinco séculos, exigiram e ainda exigem um longo trabalho de conservação. Nós lideramos um projeto de cultura de vinho, ou seja, tudo o que planejamos a longo prazo exige tempo, porque nosso desejo é de propor grandes Crus na mesma linhagem de prestígio dos vinhedos que nos cercam.
Para dar uma dimensão e a carga de trabalho de um projeto de recuperação como esse, como os espaços foram imaginados e as perspectivas arquitetônicas preservadas?
– Os apartamentos históricos de Henri de Toulouse-Lautrec, obviamente, ficaram onde estavam, na ala oeste do castelo, onde é possível visitar a grande e a pequena sala de estar, a biblioteca e as cozinhas, no piso térreo. No andar superior, encontram-se os quartos e o banheiro, destinados à Henri e sua mãe, Adèle. Em uma das pequenas torres, encontra-se o atelier de Henri, que não é acessível ao público em geral, porque sua escada não é utilisável mas onde a presença do artista pode ser sentida. Malromé era a casa familiar de Henri de Toulouse-Lautrec e para preservar esse espírito, reservamos uma pequena parte do Castelo para acomodar espaços de vida para a nossa família. Tivemos que reformar o espaço de exposição, a sala de recepção, a sala de degustação de vinhos, a loja de souvenirs, tínhamos em mente aproveitar de todos os espaços sem perder o essencial da alma do castelo. Da mesma forma, o pátio que estava em pausa e que percebemos que sua acústica era única, o que nos deu a ideia de fazer um palco para apresentações teatrais e artisticas, concertos musicais de verão.
Com tantas mudanças e reformas construtivas a serem feitas, que instruções decorativas que o arquiteto deveria seguir?
– Assumir um lugar como o do Castelo Malromé é uma grande responsabilidade, porque este lugar nos precedeu e nos sucederá, e não podíamos assumir uma reforma puramente estética, o castelo existe há cinco séculos, a renovação teveria que ser realizada de acordo com os materiais e códigos da época. Felizmente todos os nossos colaboradores que nos acompanharam neste projeto tinham isso em mente. Para o solo, por exemplo, usamos apenas a pedra de Saint Macaire e nosso arquiteto Laurent Negretti pilotou o projeto cercado pelo trabalho tradicional dos “Compagnons de France” e seus aprendizes. Da mesma forma, a decoração de interiores, assinada por Isabelle Stanislas foi feita em total coerência com o lugar e trouxe uma dimensão contemporânea ao espaço de eventos. A loja de souvenirs, que não existia antes da reforma, ganhou a aparência de uma biblioteca, os espelhos da sala de recepção foram tratados com mercúrio para dar um efeito naturalmente envelhecido e os tetos tem perfis de luz de aço inoxidável. Queríamos sinceramente oferecer uma experiência única, equilibrando passado e presente, que se encaixam perfeitamente num espaço atemporal sem caprichos estéticos.
Ainda sobre esta renovação, quais foram os desafios? Como eles foram superados?
– A realização dos espaços de recepção e exposição da ala leste foram certamente nossos maiores desafios. A área de recepção era como um hangar com seu piso de terra batida e paredes que estavam caindo, é quase impossível imaginar seu estado antes dessa reforma. Por exemplo, para criar nosso espaço de exposição, tivemos que estabelecer as bases de um novo piso, onde o concreto não era concebível, porque a construção de outrora não suportaria tal peso, foi necessário estabelecer uma estrutura metálica para escorar este imenso espaço. Além disso, a conservação das obras de arte em exposição demandam uma regulação permanente do ar, detalhes importantes que não estavam absolutamente previstos num castelo do seu tempo.
Como as equipes de colaboradores e suas interações com artesãos, arquitetos, decoradores trabalharam nesta renovação?
– Tivemos a sorte de trabalhar com pessoas de confiança e que se apaixonaram pelo projeto, que demandaria o empenho de todas as equipes durante vários anos de trabalho. No fundo, tudo é uma história de encontro, de pessoas unidas por um desejo comum de enfrentar juntos um novo desafio, onde a linha diretiva deveria ser clara e segura sem, contudo, comprometer os papéis de cada um, tivemos que aprender a confiar no conhecimento do outro, aceitar que certas coisas não são feitas na ordem correta ou não da maneira como tinhamos planejado. O piso do pátio, por exemplo, foi refeito duas vezes porque o material que escolhemos inicialmente não era adequado. Então, o que funciona em um lugar não é necessariamente adaptado a outro e assim por diante.
O Château Malromé está destinado a receber pessoas de todo o mundo, qual é o sentimento que você tem ao vê-lo, como é agora, depois desses anos de trabalho?
– É um orgulho imenso e uma responsabilidade gigantesca. Agora que chegamos ao final do projeto de renovação, temos um desafio maior, que é atrair uma clientela que torne o Castelo Malromé uma referência de arte contemporanea, ao seu patrimônio e ao vinho que produzimos localmente. Malromé foi uma escolha do nosso coração, teremos que dedicar muita energia a ele, que demanda o emprego de tempo integral. É difícil imaginar um projeto da mesma magnitude.
O que você terá prazer em realizar no Château Malromé no futuro próximo?
– Malromé é um lugar que deve ser percebido como a conservação de uma herança que homenagea a arte, nossa memória familiar e a cultura francesa. Quando falamos de cultura francesa, desejamos exprimir muitas coisas. Em primeiro lugar, é claro, um projeto de vinicultura: nossa vinha foi amplamente retrabalhada graças ao nosso diretor-geral Charles Estager e já produzimos vinhos de excelente qualidade. A videira é um trabalho de todos os dias e um vinho de alta qualidade que não tem condições de ser produzido em um ano. Em contraartida, num futuro muito próximo, queremos investi na gastronomia, através do Café Adèle, que propõe uma cozinha moderna com ingredientes locais e, portanto, sazonais, revisada com um toque asiático com base harmonização dos vinhos e do mel que produzimos e, outro projeto que temos em andamento, são os vegetais da nossa horta. Além de toda cultura eno-turística e gastronômica, nossa programação artística está no cerne das nossas preocupações e reivindicamos a permanência da arte como um movimento permanente, através de concertos musicais, teatros ao ar livre, exposições temporárias e muitos outros eventos que estão por vir.
Como vocês estao vivendo esse projeto que começou como um sonho de família?
– Quando olhamos para trás, percebemos a dimensão do projeto, o que, em última instância, é ainda mais ambicioso do que o que tínhamos imaginado. Malromé é nossa residência familiar. Essa noção de lar é muito importante para nós, que gostamos de trabalhar em família, entre irmãs, com nossos pais, mas também com nossa família do coração, com a qual Malromé foi reconstruída. Colette e Jean-Paul Paris, por exemplo, são amigos do nosso pai há trinta anos, seus filhos são como primos que cresceram conosco ao mesmo tempo. Este projeto não poderia ter sido feito sem os que nos acompanharam até agora, afinal, Malromé é uma aventura compartilhada, é uma construção familiar, no mais amplo sentido do termo.
IMAGEM Château Malromé © Benoit Linero
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