Tatuando paredes
Se a arte é uma ilusão, o pontilhismo é a melhor delas. Com essa ideia em mente Alix Waline dá asas a sua imaginação com seus desenhos que tem formas orgânicas e aleatórias que, uma vez confrontados com a fluidez da tinta, se transformam em criações contidas e precisas. O destaque dos detalhes de suas obras fica por conta do contraste entre a singeleza dos meios utilizados, tinta, caneta hidrográfica, lápis e o desejo de extrapolar o que há de mais belo e puro nessa delicada arte pontuada de paciência. Ao olhar atento do observador nada escapa e e é ele quem faz com que essa arte ilusória do pontilhado se transforma em poema artístico, que pode tanto ser aprisionado em uma moldura ou seguir livre tatuando as paredes. Para falar de sua liberdade artística, Alix Waline conversou com exclusividade com Correspondance Magazine® e nos contou de onde vem esse fascínio por essa arte que nasceu na França. Formada em Belas Artes com ateliês de escultura e uma abordagem para o desenho que está mais próxima da modelagem do que da linha, a artista se entrega de corpo e alma aos seus desenhos como quem traça o seu destino. “Durante o confinamento, desenhar tornou-se essencial e me ajudou a escapar dessa nova realidade…”
Houve um momento crucial em que você decidiu seguir sua carreira arística?
– Foi uma evolução gradual. Mas a hipersensibilidade e a necessidade de me expressar sempre estiveram presentes. Em um momento decisivo na vida, percebi que essa era minha única saída. Ao mesmo tempo, tive a chance de fazer uma residência artística no norte da Tailândia e esse foi o verdadeiro gatilho.
Qual é a sua rotina diária quando você trabalha?
– Tento trabalhar o corpo e a mente. Isso é fundamental para estar centrado e encontrar o foco e a entrega necessários.
Você poderia nos contar mais sobre seu estilo e como você conseguiu desenvolvê-lo?
– Trabalho principalmente com desenho, seja em trabalhos de parede in situ com marcadores, seja em papel misturando tinta, caneta hidrográfica e lápis. Gosto que surjam formas e que elas dêem corpo ao movimento. Sou obcecada pela pele e pelo tato. Quero falar do corpo humano, mas sem representá-lo; é a vida, falando sobre a mecânica interna do corpo humano que me interessa. Desenvolvi uma estética pontilhista, nuvens de pontos que moldo, para obter um efeito vibratório. Se eu tivesse que definir meu estilo, diria que é uma forma de “impressionismo mínimo”.
Em geral, como acontece suas sessões criativas ? Qual é a parte da preparação e qual é o lugar da improvisação durante?
– Passo muito tempo descobrindo o trabalho de outras pessoas, lendo, ouvindo música e me mantenho em alerta para absorver o momento criativo. Também tenho coleções de imagens inspiradoras, agora são os minerais e cristais que me fascinam. Preciso me nutrir para poder invocar intuitivamente com essas imagens mentais quando estou criando. É todo esse trabalho anterior que permite que eu me solte no momento da criação. É realmente um vaivém constante entre a entrega e o controle. Um nunca deve pegar o lugar do outro. É preciso encontrar o ponto de equilíbrio.
Que outras áreas artísticas lhe interessam ou que você gostaria de experimentar?
– Sou muito interessada em Artes Decorativas em geral. Não gosto dos limites entre as práticas artísticas, gosto da ideia de arte total. Admiro muito o trabalho de Sonia Delaunay e Nathalie du Pasquier por sua liberdade e capacidade de mudar de um meio para outro. Já tive a oportunidade de desenhar tapetes para Pinton ou criar um papel de parede, e o meu sonho seria criar um layout total, gosto da ideia de ficar totalmente submersa no processo criativo.
Por qual parte do seu trabalho você gostaria de ser lembrada? Por quê?
– O trabalho que não fiz ainda! Seria justamente uma obra global que combinaria arquitetura, ornamentação, volume e desenho.
Se você pudesse trabalhar em um movimento artístico do passado, qual escolheria?
– Gostaria de vivenciar o início da Abstração. Deve ter sido incrível viver essa revolução estética onde a arte deixou de ser uma imitação formal da natureza e se tornou uma transcendência. Também acho que teria adorado trabalhar na Bauhaus.
Como você definiria arte em 140 caracteres ou menos?
– Arte é o que nos eleva, que nos ultrapassa, que desperta os nossos sentidos. É uma proposta para um novo olhar sobre um acontecimento, situação ou fenômeno que nos move ou nos faz pensar. É um percurso pessoal que nos tranquiliza ou perturba. Arte é um lugar onde cada pessoa constrói as suas próprias referências e as transforma num refúgio onde o espírito pode escapar.
Que outros artistas interessam e inspiram você?
– Há muitos! Admiro muito o trabalho de Laurent Grasso e sua dimensão metafísica. Pierre Soulages pela prática formal e abordagem do assunto. Georgia O’Keeffe por suas pinturas ambíguas, James Turrel por seu trabalho leve. Os desenhos das paredes de Sol Lewitt, pelo seu rigor, os abundantes trabalhos ornamentais de Pierre-Marie, as misteriosas pedras esféricas da Costa Rica, as melancólicas paisagens de Caspar David Friedrich… a lista é muito longa.
Quais os seus próximos projetos?
– Em breve estarei trabalhando em vários projetos de paredes em casas particulares e em locais públicos, mas não posso dizer mais no momento.
O que você sonha como artista?
– Viajar e fugir! Adoraria desenvolver projetos no exterior e enriquecer minha prática com know-how artesanal. Aprecio a ideia de aprendizagem ao longo da vida.
EDIÇÃO DE TEXTO – Marilane Borges
IMAGEM – Cortesia da artista Alix Waline com portrait clicado por Andrea Bresciani © Todos os direitos reservados
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