Pierre Soulages

10 de março de 2016

              Convidamos o crítico de arte do jornal “La Libre Belgique”, Roger Pierre Turine, para apresentar aos nossos leitores um dos maiores artistas franceses, Pierre Soulages

Há encontros que contam muito na nossa vida. Encontros que não podem ser explicados mas que nasceram para se viver ao quadrado, ao cubo ou, em última instância, sem nenhuma fórmula de ostentação e que podem se estender além do tempo. Encontros que, de informais, se tranformaram em momentos de cumplicidade ritmados pelo movimento do relógio e numa evidência quando uma amizade repentina se instala.

Pierre Soulages, 96 anos, com sua corpulência grande, quase gigante, se impõe. Ele parece altivo mas seu sorriso é caloroso, mesmo quando vestido de preto da cabeça aos pés, uma cor que se encaixa como uma luva… também preta, claro. “Tenho origem celta, provavelmente habitada num antigo fundo gaulês, origens próximas às dos Flanders. Amplo e grande, não tenho nada do tipo mediterrâneo com o qual algumas pessoas me associam porque vivo parte do ano em Sète, no sul da França. Um dia, em Ostende, na Bélgica, com uma roupa que poderia sugerir um terno de marinheiro, olhava a vitrine de uma loja e pela maneira como estava vestido, a vendedora se virou para mim e falou em Flamengo!”

Pierre Soulages

Em outubro de 2009, Pierre Soulages desfrutou de sua quarta grande exposição em Paris. As precedentes aconteceram em 1967, 1979 e 1996, no Museu de Arte Moderna da Cidade de Paris. No Centro Pompidou, foram mostradas, com o sucesso que conhecemos, mais de sessenta anos de pinturas constantemente acompanhadas pela ousadia. Como uma referência em relação ao tempo, Soulages não dá títulos às suas pinturas mas a data de quando eles foram criados e, por corolário, o espaço que eles necessitam e ao qual o artista atribui uma imensa importância. Desde o início, como símbolos de uma viagem à parte, Soulages, indica e referencia cada uma de suas telas: a técnica utilizada, suas dimensões e data em que foi produzida. Dentro desse universo que guarda sua própria dimensão, a exposição do artista pode ser visitada quase em silêncio. Uma reverência sem dúvida que demanda as cor preta.

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Voltemos no tempo… Na época, eu escrevi na La Libre Belgique: “Em uma centena de telas, em última análise, é possível multiplicar por dois ou três, se a soma de dípticos, trípticos ou polípticos da composição é feita. Com Soulages chegamos a um ponto alto na arte da pintura que é uma potencialidade única, uma felicidade exorbitante em prol da pintura. O inventário de suas criações começa em 1946 e termina (nota do autor: na época) em 2009, se a evidência é de apenas 90 anos contados, o artista não arquivou nem sua crença, nem seus pincéis e muito menos seus potes de cores. Este pintor é um gigante, um homem que parece destinado à envelhecer jovem, empreendendo todo o seu talento em nome da arte, convencido de ter encontrado o seu caminho numa relação explosiva com a única cor que ele ama e que tanto perturba os outros: o preto.

“Sim, o preto, não sei por quê amo essa cor desde sempre. Até minha mãe não gostava quando me vestia de preto. Ela me dizia: “Você já está usando a cor do meu luto!” Com o preto falo um pouco como os anarquistas, sem ser um deles. As autoridades também estão sempre usando preto. O smoking é preto e os padres beneditinos vestem-se de preto. Preto é a cor da austeridade mas isto não tem nada a ver com a minha pintura! Afinal, o preto e o branco são as únicas cores fora do espectro. Um dia estava pintando e o preto invadiu toda a superfície da tela. Neste extremo, vi uma espécie de negação do preto, as diferenças de texturas refletiam suavemente a luz, das sombras emanavam uma claridade, uma luz pictórica cujo poder emocional especial animava o meu desejo de pintar. Amo essa cor violenta que incentiva à interiorização. Como uma revelação, meu instrumento de trabalho não era a cor preta mas essa luz secreta que vem do preto…”

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