Bordados de alta-costura

24 de abril de 2022

A autora Nadia Albertini se debruçou sobre os bordados de alta costura e traça meticulosamente todas as etapas dessa confecção sobre o trabalho do renomado atelier de bordados Rébé. “René Bégué – Bordados de Alta Costura” teve como padrinho de projeto o estilista Hubert de Givenchy, que inspirou a ideia deste primeiro livro dedicado ao savoir-faire e à herança cultural da moda francesa.

Publicado pelas edições Gourcuff Gradenigo, a publicação conta a história pouco conhecida e fascinante da obra de René Bégué (1887 – 1987), conhecido como Rébé, e de sua esposa Andrée Pichard, uma dupla excepcional que marcou intimamente a história da moda.

Verdadeira pepita de alta costura sobre a herança têxtil francesa, ainda desconhecida do público em geral, mas cujo nome ecoa como um mito entre os estilistas de alta costura que, através de suas deslumbrantes criações decorou as mais belas roupas com seus modelos deslumbrantes. Para contar a epopéia desse projeto, que levou três anos para ser concluido, a autora Nadia Albertini conversou com exclusividade com Correspondance Magazine®.

Você poderia nos contar a história de como nasceu esse projeto do livro sobre “René Bégué – Bordados de Alta Costura”?

– Este projeto nasceu quando estava em Nova York trabalhando como designer de bordados para uma grande marca americana de prêt-à-porter. Tinha saído da França há um ano e trabalhava num ambiente muito enriquecedor, mas onde me faltava essa relação com o artesanato e a história.

Visitar os arquivos das bordadeiras para minhas pesquisas sobre as coleções, ir aos mercados de pulgas de Saint-Ouen e Vanves sempre foram uma fonte de inspiração e inspiração para mim. Quando perdi meu emprego tive a oportunidade de escrever sobre a história do bordado na França para a Stitch Ideas, uma revista japonesa. Foi nesse período de pesquisa que me deparei com um artigo que falava de Rébé e seus maravilhosos bordados preservados no Tarn, um departamento da região da Occitânia, no sul da França. Foi a partir deste artigo, encontrado por puro acaso na internet, que surgiu a ideia de escrever um livro.

Como você se preparou para editar esse livro e quais foram as etapas imprescindíveis para dar cabo desse projeto?

– Para entender a carreira de Rébé, tive que entender sua obra na íntegra, de A a Z e sob todos os ângulos. Além disso, queria ver absolutamente todas as amostras disponíveis. O Rébé doou os seus arquivos a 5 museus diferentes e quis visitá-los para consultas. No início foi complicado, as instituições estavam muito ocupadas e muitas vezes sem pessoal para me receber. Mas sou tenaz e persistí. Os agendamentos foram cuidadosamente planejados, às vezes com meses ou semanas de antecedência, porque eu ainda estava em Nova York e tinha que planejar viagens para a França.

Durante as minhas visitas às instituições tive que convencer os museus a me deixar ver e tocar tudo. Venho do mundo do design de moda e, portanto, não do mundo acadêmico ou da pesquisa histórica. Tive que justificar a importância da minha pesquisa, explicar o que pretendia fazer.

Depois de convencê-los e essa etapa superada, descobri maravilhas como se estivesse acessado o paraíso. As dificuldades foram rapidamente esquecidas e pude fazer o meu trabalho com a preciosa ajuda dos especialistas, com a benevolência dos curadores e das equipes, como os responsáveis ​​pela iconografia, bases de dados, etc.

O trabalho árduo foi o de juntar as amostras com as peças feitas, os modelos bordados para X ou Y internamente. Foi emocionante e eu passei minhas noites fazendo isso. Fazia meu trabalho criativo durante o dia e meu trabalho de pesquisa histórica à noite, e isso alimenta o meu espírito e me permite ver coisas magníficas.

Quanto tempo você levou para planejar todas essas pesquisas?

– Fiquei cerca de três anos na parte de pesquisa, documentação, identificação de modelos, confirmação com casas de moda. Fotografei todas as doações, fiz os inventários que faltavam, demorou muito apesar de tudo. Então, quando tive a sensação de dominar bem o assunto, dediquei-me à escrita pura e dura. Construir o plano do livro, detalhar cada parte, montar bem os capítulos, garantir que fosse o mais fácil, compreensível e fluido possível para um leitor que não necessariamente conhece todos os termos técnicos de bordado ou mesmo de moda.

Como você encontrou as peças icônicas que aparecem nas páginas desta publicação?

– Foi a parte mais interessante, como um jogo de memória. Assisti e quase memorizei as amostras como um todo. E, ao mesmo tempo, olhei todas as revistas da época, Vogue, Harper’s Bazaar, Femina, L’écho de la mode, Jardins de Mode… durante as minhas visitas. Fiz a ligação entre o que dormia nas páginas das revistas e o que dormia nas gavetas dos maiores museus da França. Visitei também as reservas de outros grandes museus de moda, como o V&A, o MET, o Museu de Chicago, o Henry Ford em Detroit. Frequentei lugares muito bonitos e as portas finalmente se abriram, apesar de ser uma completa desconhecida.

Quais foram os critérios para que peças de Balenciaga, Dior, Fath, Givenchy, Lanvin, Roger Vivier, Swarovski e até Yves Saint Laurent fizessem parte desta publicação?

– Quis, através deste livro, mostrar a criatividade do ateliê Rébé e sua imensa contribuição para a alta costura francesa. Por isso escolhi modelos para os quais pude traçar todo o processo criativo. Do esboço técnico, chamado de camada, feito por Rébé para a primeira amostra, depois a amostra bordada, que se transforma em esboço de um vestido quando chega às mãos do costureiro. Às vezes até conseguimos encontrar o vestido em um museu ou coleção particular, bem como a fotografia dele em uma revista da época. Todo o processo está lá.

Existem personalidades do mundo da moda ou de outros setores artísticos que o influenciaram a escrever este livro? Como e por quê ?

– Sim, existe uma figura central no mundo da moda que tornou este livro possível: o Sr. Hubert de Givenchy. A ex-diretora dos arquivos da Balenciaga, Sra. Marie Andrée Jouve, falou sobre mim e sobre a minha pesquisa e ele muito gentilmente quis me ajudar e me apresentou ao seu editor, Alain de Gourcuff. Sem sua ajuda, este livro provavelmente nunca teria visto a luz do dia. Pude conhecer pessoas maravilhosas, em todos os museus que tive acesso. Colecionadores como Enrico Quinto e Hamish Bowles também foram grandes fontes de inspiração e apoio.

Se os leitores pudessem reter apenas um ponto importante sobre a publicação do livro “René Bégué – Broderies Haute Couture” ou sobre moda em geral, qual seria?

– Gostaria que este livro fosse percebido como uma homenagem a um casal excepcional e às maravilhosas criações que eles imaginaram. Não falamos o suficiente sobre a criação que nasce nas oficinas. O grande público tende a imaginar que bordados, plumas, rendas, tecidos, jacquards e tudo o que gira em torno de um vestido são imaginados única e exclusivamente nos estúdios de design das casas de moda e que os fornecedores apenas executam essas ideias. Mas está errado. Grande parte da criação e criatividade que vemos nos desfiles vem desses fornecedores. Eles imaginam coleções de padrões, bordados, efeitos nos mais diversos tecidos e vêm oferecê-los às casas de alta costura. Foi assim com Rébé durante os seus sessenta anos de criação.

Como você definiria o estilo René Bégué?

– Rébé foi um atelier de bordados excepcional, herança da alta costura francesa e um tesouro inestimável do savoir-faire francês.

Você tem algum projeto de livro futuro que possa nos contar? Ou projetos iniciados que você vai terminar em breve…

– Sim, estou preparando um segundo livro sobre outro atelier de bordado pouco conhecido: o atelier de Kitmir, fundado pela grã-duquesa Maria da Rússia em 1921. Esta oficina, da qual raramente ouvimos falar, criou maravilhas para Mademoiselle Chanel.

 

EDIÇÃO DE TEXTO – Marilane Borges

IMAGEM – Cortesia das Edições Gourcuff Gradenigo e da autora Nadia Albertini © Andrée e René Bégué, desenham e bordam juntos, formando uma dupla criativa excepcional © Nadia Albertini © Para a Balenciaga, Rébé borda este bolero de cetim com fios de chenille multicoloridos, um material que imita o veludo. Este modelo é mantido no Kunstmuseum em Haia © Kunstmuseum Haia Motivos persas, botehs e romãs, são delicadamente bordados em relevo com laminette de prata, pérolas e strass no vestido de noiva de Farah Diba © Matthieu Ferrier © Dior Heritage – Dior. Detalhe do vestido Formose 1954 Este par de sapatos Christian Dior, desenhado por Roger Vivier e suntuosamente bordado com gotas de vidro, foi leiloado na Sotheby’s em 2017 © Sotheby’s © Dior Héritage – Dior Vilmorin 1952 © Dior Heritage – Dior Viguier © Todos os direitos reservados

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